No místico [...] começa por operar-se um estreitamento da consciência do mundo exterior, compensado por acrescento intensivo do campo da consciência do mundo interior.
Manuel Laranjeira
A doença da Santidade
proporções óbvias 
entre o místico e o louco
se a regra é a de proporcionalidade então essa é a verdade, o místico é proporcional ao óbvio e o óbvio ao louco, o que não é proporcional não existe.
uma linha vertical desenhada a meio do olho, em frente o olhar óbvio, subindo e descendo a linha, o místico e o louco, incapacitando o caminhar.
o louco corre para dentro, o místico corre para fora, deixando assim o óbvio calmamente no início.
uma nova teoria despede-se da velha com um aperto de mão e seguem em sentidos contrários. o louco e o místico despedem-se com as mãos do mesmo corpo e seguem em cruz.
o místico escreveu uma longa carta ao louco a explicar-lhe que não está sozinho, o louco respondeu, com um pequeno poema, a explicar ao místico que não está acompanhado.
o óbvio pode ter medo. as coisas óbvias podem ter medo e disfarçar para não nos assustarem. os planetas podem ter medo. e se a realidade tem medo de nós - os átomos são mais loucos e místicos que óbvios.
o louco dança com arcos de óbvios à cintura. o erro dança com arcos de loucos à cintura. o óbvio dança com arcos de erros à cintura. a música que ouvem é a mesma. não é mística, nem louca, nem óbvia.
o místico e o louco acreditam que é óbvio acreditar. o óbvio acredita que é místico e louco acreditar. acreditam.
o louco segue a dança das peças, o místico os quadrados pretos e brancos do tabuleiro, o óbvio as regras. ninguém ganhou ainda.
a lágrima do louco é abandonada à saída, a do místico é lançada para cima e a do óbvio é disparada em frente. as lágrimas demoram o mesmo tempo a chegar ao chão.
o místico não utiliza ferramentas, por falta de curiosidade, o louco não distingue as ferramentas da curiosidade, o óbvio utiliza como ferramenta a curiosidade, que repete até à exaustão do material.
o louco tem asas, o místico tem asas, o óbvio pode voar.

3 comments:

josé luís said...

é óbvio que o místico é louco
a mística é uma loucura óbvia
os loucos são óbvios místicos

[variações a-b-c/b-c-a/c-a-b]
[ah... grande texto, este seu :) ]

Joana Espain said...

Bela variação:). Obrigada pela visita!

josé ferreira said...

Joana
muito original esta dança que mistura tudo, o óbvio, o louco e o místico, partindo de uma premissa de partida, logo no início, uma proporcionalidade que existe e justifica. Concluindo "acreditam" embora não saibam, não se apercebam que há "proporções óbvias" entre todos eles.
gostei muito,Joana, genial :)